segunda-feira, agosto 05, 2019
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Vingança por morte de primo motivou 'Chacina do Benfica', aponta investigação da Polícia Civil do Ceará
Vingança por morte de primo motivou 'Chacina do Benfica', aponta investigação da Polícia Civil do Ceará
A Chacina do Benfica aconteceu no dia 9 de março de 2018, no Bairro
Benfica, e resultou em sete mortos e três feridos. — Foto: Kléber A. Gonçalves/
SVM g1 ce
Investigações realizadas pela Polícia Civil do Ceará (PCCE) apontam
que a "Chacina do Benfica", ocorrida em março de 2018, em Fortaleza,
teria sido motivada especialmente por vingança pela morte do primo de um dos
réus. Os envolvidos na matança e o alvo principal daquela fatídica noite - que
não foi encontrado pelos algozes - cresceram juntos no bairro e se distanciaram
em razão das filiações diferenciadas a facções criminosas rivais, que disputam
territórios na capital cearense.
A chacina aconteceu no dia 9 de março do ano passado, no Bairro
Benfica, em Fortaleza. Na matança, sete pessoas foram executadas e três ficaram
feridas em três locais diferentes da região: a Praça da Gentilândia, a Vila
Demétrio (nas proximidades da sede da Torcida Uniformizada do Fortaleza - TUF)
e o cruzamento das ruas Joaquim Magalhães e Major Facundo.
Segundo as investigações da Polícia Civil, cinco pessoas
participaram ativamente do crime; três delas estão presas, uma não foi
identificada e ainda um adolescente, cuja apreensão não foi confirmada pela
Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo. As
apurações do crime mostram uma série de provas materiais que sustentam a tese
de acusação do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE).
O processo sobre a chacina, que tramita em segredo de Justiça na 5ª
Vara do Júri da Comarca de Fortaleza e já dispõe de mais de 3,2 mil páginas,
foi obtido pelo G1. Os autos revelam os pormenores das mortes nos três locais
do bairro.
No fim do mês de abril, os réus da ação (Douglas Matias da Silva,
Stefferson Mateus Rodrigues Fernandes e Francisco Elisson Chaves de Souza)
foram pronunciados pela Justiça. Eles deverão ser julgados por sete pessoas em
um Tribunal Popular do Júri e podem ser condenados a quase 285 anos, 285 anos e
165 anos, respectivamente. Os três deverão responder por homicídio, homicídio
tentado e organização criminosa.
Vingança
Embora as facções criminosas façam parte do pano de fundo da
organização e tenham atuação direta na matança, a trama está longe de ser
explicada unicamente por esses grupos. A principal linha de investigação
relativa à motivação, confirmada por testemunhas e pelo réu Stefferson Fernandes,
sugere que houve uma trama de vingança que relaciona o alvo principal da
chacina a outro assassinato ocorrido na região.
Exatamente um mês antes dos crimes, em 9 de fevereiro de 2018,
Jorge Luis Rodrigues da Silva, de 25 anos, foi morto no Bairro de Fátima, cujos
limites territoriais com o Benfica se confundem. Jorge Luis era primo do réu
Stefferson Fernandes. Conforme as investigações da Polícia Civil, Stefferson e
seus comparsas culpavam Geovane Diogo Silva Oliveira pelo homicídio do primo.
Por isso, ele se tornou um alvo.
Uma semana antes da chacina, após sair do sistema carcerário
cearense, onde cumpria pena por porte ilegal de arma de fogo, Geovane Oliveira
voltou a frequentar espaços do Benfica, como a Praça da Gentilândia e a Rua
Joaquim Magalhães, nas proximidades da sede da TUF. Os réus receberam as
informações do paradeiro de Geovane e, segundo as apurações criminais, foram
aos locais dos crimes em busca dele.
O alvo da noite de sexta-feira no Benfica seria, principalmente,
Geovane Oliveira, mas ele não estava na região. Após chegarem ao local e não
localizarem o desafeto, os criminosos encontraram lá o primo dele, José Gilmar
de Oliveira Júnior, de 33 anos, com passagens por roubo e posse de drogas. Alvo
de nove tiros, o homem foi o primeiro a ser assassinado no massacre. As duas
outras vítimas da Praça (Antônio Igor Moreira e Silva, 26, e Joaquim Vieira de
Lucena Neto, 21) não tinham relação com a vingança.
Em depoimento concedido à Polícia Civil após sua prisão, Stefferson
Fernandes assumiu a autoria do atentado contra José Gilmar, o primo de Geovane
Oliveira; ele disse que "descarregou seu revólver" no homem naquela
noite. Além disso, a Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) atestou que os
disparos que mataram José Gilmar não saíram apenas de uma arma de fogo, o que
corrobora a participação de outra pessoa no assassinato.
Stefferson Fernandes e José Gilmar, inclusive, já haviam sido
denunciados pelo Ministério Público por uma tentativa de assalto, ocorrida em
2010. Segundo o MPCE, esse delito demonstra aproximação entre eles e pode
ajudar na narrativa construída para condenar o réu por motivação torpe.
Ato contínuo
Após a matança na Gentilândia, sem ter encontrado Geovane Oliveira,
o grupo criminoso saiu em direção às proximidades da sede da TUF e, no local,
perguntou novamente pelo desafeto. Não encontrando-o, eles mataram mais dois
jovens que teriam sido identificados como integrantes da facção rival. Contudo,
Adenilton da Silva Ferreira, 24, e Carlos Victor Meneses Barros, 23, não
pertenciam a nenhum grupo criminoso, bem como não tinham antecedentes
criminais.
No terceiro ponto, no cruzamento das ruas Joaquim Magalhães e Major
Facundo, também no Benfica, os homicidas avistaram outros dois supostos
inimigos e confundiram Emilson Bandeira de Melo Júnior, 27, com um homem
chamado "Everton". Ele vinha na garupa de uma motocicleta pilotada
por Pedro Braga Barroso Neto, 22, após ambos terem ido comprar bebida alcoólica
em um bar. Eles foram atingidos pelos disparos do grupo criminoso e foram as
duas últimas vítimas da noite.
Infância
A relação entre os réus da Chacina do Benfica e o alvo principal
que não foi morto no dia 9 de março é de longa data. Douglas Matias, Stefferson
Fernandes, Elisson Chaves e Geovane Oliveira se conheciam desde a infância.
Eles moravam no limite entre os bairros Benfica e Fátima e acabaram crescendo juntos,
mas enveredando pelo mundo do crime, como aponta a investigação.
Embora os réus neguem que eram amigos de infância de Geovane, este
afirmou, em depoimento, que "conhecia os três acusados e teve amizade com
eles na infância". Elisson Chaves respondeu, em juízo, que "eles
todos cresceram juntos, inclusive Geovane". Conforme o próprio
"Geo", o motivo da inimizade dele com os acusados "seria 'guerra
de facção'", pois eles são de grupos criminosos divergentes, disse em depoimento
à Polícia Civil. Os demais não se pronunciaram sobre a razão do rompimento da
amizade.
O G1 entrou em contato com a Defensoria Pública, que é responsável
pela defesa dos três réus, mas a assessoria informou que não iria se pronunciar
sobre o caso. A defesa de Geovane Diogo Silva Oliveira não foi localizada. O
MPCE também foi contatado, porém o promotor responsável pela denúncia não quis
gravar entrevista.
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