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sexta-feira, junho 16, 2017

RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA Nº 008/2017


“Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar.”
Bertold Brech

                    O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, por intermédio de seu Promotor de Justiça que abaixo subscreve, com fundamento nos artigos 127 da Constituição Federal, 26, VII, 27, § único, IV da Lei Ordinária Federal nº 8.625/93 (LONMP); 7º, II e III, 8º, II, II IV e IX §§ 3º, 5º e 9º, IV da Lei Complementar 75/93; e legislação correlata;

CONSIDERANDO ser dever constitucional do Ministério Público “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia” (CF/88, art. 129, II);

CONSIDERANDO estar a Administração Pública adstrita aos princípios de eficiência, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, nos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO o notório hábito de alguns administradores públicos nomearem para cargos e funções de confiança parentes seus, ou permitirem o acesso a esses mesmos cargos e funções a parentes de titulares de cargos eletivos ou a parentes de secretários municipais, em troca de apoio político;

CONSIDERANDO que a contratação sem concurso público e/ou seleção simplificada somente se revela cabível para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, afastando-se, assim, “os ineptos e os apaniguados, que costumam abarrotar as repartições num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantêm no poder, leiloando empregados públicos” ;

CONSIDERANDO constituírem tais práticas evidentes violações dos princípios constitucionais da legalidade, isonomia, moralidade e impessoalidade, além de comprometer, no mais das vezes, a eficiência que deve ser inerente à atuação estatal;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante n° 13, segundo a qual: “a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal”;

CONSIDERANDO ser o concurso público a forma mais legítima de acesso a cargos públicos, por promover a seleção isonômica dos melhores candidatos;

CONSIDERANDO que no julgamento da Reclamação n° 26.303, no Supremo Tribunal Federal, o eminente Relator, Min. Marco Aurélio, consignou que a Súmula Vinculante 13, aprovada em 2008, contempla três vedações distintas relativamente à nomeação para cargo em comissão, de confiança ou função gratificada, em qualquer dos Poderes de todos os entes integrantes da federação: proíbe designar parente da autoridade nomeante; parente de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento e ainda a prática do nepotismo cruzado (designações recíprocas).

                    CONSIDERANDO que ainda no referido julgamento, o Min. Marco Aurélio destacou a natureza proibitiva da súmula vinculante:

‘Indago: o Verbete vinculante nº 13 prevê – não cabe interpretar verbete, muito menos ‘a contrario senso’ e vou esquecer aqui o precedente, a ocupação de cargo público anterior – a possibilidade de nomeação de parente consangüíneo, no segundo grau, para secretaria de Estado? A resposta é negativa. Não se tem, no teor do verbete, qualquer referência a agente político. Aliás, versa proibição e não autorização. ’

CONSIDERANDO que em reunião de trabalho da Promotoria de Justiça de Iracema e Ereré com atuação na área do Patrimônio Pública e Moralidade Administrativa, ocorrida em 07 de junho de 2017, concluiu-se que o Ministério Público deve atuar seguindo o entendimento do Ministro Marco Aurélio, inclusive pedindo o afastamento dos parentes de gestores que tenham sido nomeados para cargos políticos, bem como ajuizando ações de improbidade, superando assim o entendimento adotado quando da expedição da Recomendação no. 02/2016;

CONSIDERANDO que já estão sendo proferidos diversos precedentes reconhecendo a superação do entendimento jurisprudencial anterior (OVERRULING), a exemplo da decisão liminar, prolatada pela Juíza de Direito Karoline Cândido Carneiro, nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa de nº 8000415-11.2017.805.0170, proposta pelo Ministério Público do Estado da Bahia, na Comarca de Morro do Chapéu, através da qual foi reconhecida a nulidade dos atos de nomeação de agentes políticos, bem como determinado o afastamento imediato e a proibição de exercício de função pública comissionada naquele município (Decisões em anexo);

CONSIDERANDO que tem emergido do povo brasileiro uma relevante pauta ética que reverbera no Direito e exige, com maior vigor, a preponderância de valores democráticos e republicanos, DE MODO QUE DEVE SER DESCREDENCIADA QUALQUER PRÁTICA DE NEPOTISMO, MESMO QUE O AGENTE POLÍTICO POSSUA QUALIFICAÇÃO TÉCNICA;

CONSIDERANDO que “reputo não convincente o argumento de que basta a aptidão técnica do parente nomeado para afastar a possibilidade da ocorrência do nepotismo. Ocorre que a gestão da coisa pública demanda muito mais que ‘simples conhecimento técnico’ na área ocupada. Se fôssemos abrandar a regra da Súmula Vinculante n. 13 com este fundamento, seria o mesmo que admitir,  por exemplo, que um exímio médico será inexoravelmente um exímio secretário de saúde ou, ainda, que um artista consagrado pela mídia será um Secretário da Cultura inigualável. Não, as coisas não funcionam assim com essa ‘certeza matemática’, e a regra contida na Súmula Vinculante n. 13 não pode ser tão facilmente afastada.E voltemos a dizer que a vedação ao nepotismo não é mera recomendação constitucional, mas sim verdadeiro mandamento, não devendo ser desprezada de inopino” (Parte do voto do Ministro Celso).

CONSIDERANDO que os gestores que insistirem na manutenção indevida de parentes na máquina administrativa estarão sujeitos às conseqüências da lei de improbidade;

RESOLVE expedir a presente RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA ao excelentíssimo senhor JOSÉ JUAREZ DIOGENES TAVARES, Prefeito Municipal de Iracema, e a quem quer que lhe suceda ou substitua no cargo de Chefia do Executivo Municipal, para que:

1. anule as contratações, designações e nomeações de   DIEGO CABÓ DIOGENES – Secretário de Governo e Articulação (Filho do Prefeito), bem como de todos os agentes públicos que sejam cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, da autoridade nomeante, do Prefeito, do Vice-Prefeito, dos Vereadores ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública Municipal, evitando ainda a formação de novos contratos, designações ou nomeações com as aludidas restrições;

2) proceda, no prazo de 20 (Vinte) dias, a EXONERAÇÃO de todos os ocupantes de cargos comissionados, cargos diretivos ou de chefia ou funções de confiança ou gratificadas, ainda que de empresas públicas ou autarquias municipais, que sejam cônjuges ou companheiros ou parentes até o terceiro grau, em linha reta, colateral ou por afinidade, de quaisquer das pessoas ocupantes dos cargos de Prefeito Municipal, Vice-Prefeito, Secretários Municipais, Chefe de Gabinete, Presidente da Câmara Municipal, ocupantes da mesa diretiva da Casa Legislativa, Vereadores, e com ocupantes de cargos em comissão em empresas públicas e autarquias municipais, para provimentos de cargos em comissão, funções gratificadas, ou em caráter temporário;

3) a partir do recebimento da presente recomendação, se abstenha de nomear pessoas que sejam cônjuges ou companheiros ou parentes até o terceiro grau, em linha reta, colateral ou por afinidade, de quaisquer das pessoas ocupantes dos cargos de Prefeito Municipal, Vice-Prefeito, Secretários Municipais, Chefe de Gabinete, Presidente da Câmara Municipal, ocupantes da mesa diretiva da Casa Legislativa, Vereadores, e com ocupantes de cargos em comissão em empresas públicas e autarquias municipais, para provimentos de cargos em comissão, funções gratificadas, ou em caráter temporário;

4) a partir do recebimento da presente recomendação, se abstenha de contratar, em casos excepcionais de dispensa ou inexigibilidade de licitação, pessoa jurídica cujos sócios ou empregados sejam cônjuges ou companheiros ou parentes até o terceiro grau em linha reta, colateral e por afinidade, de quaisquer das pessoas ocupantes dos cargos citados nos itens acima;

5) envide esforços a elaboração de lei municipal específica disciplinando expressamente os casos de caracterização de conduta denominada “nepotismo”, com a vedação para a contratação nos termos expressos, caso ainda não exista;

6) remeta a esta Promotoria de Justiça, mediante ofício, 10 (dez) dias após o término do prazo acima referido, cópia dos atos de exoneração e rescisão contratual que correspondam às hipóteses referidas nas alíneas anteriores;

Sejam realizadas as comunicações de praxe aos Órgãos da Administração Superior do MPCE (Corregedoria e CSMP) para fins de ciência e acompanhamento da matéria;
Nos termos do art. 20, §8o da Resolução 036/2016, remessa de cópia da presente Recomendação ao CAOPP (Centro de Apoio Operacional de Defesa do Patrimônio Público e Moralidade), por meio eletrônico (caodpp@mpce.mp.br);
Encaminhe-se cópia desta Recomendação para que seja publicada no Diário Eletrônico do MP e no quadro de avisos desta Promotoria de Justiça.
São os termos da notificação recomendatória do Ministério Público, a qual se requisita seja dada ampla e imediata divulgação, se possível, pelo sítio eletrônico do Município, por afixação no átrio das respectivas repartições públicas, com observações expressas quanto ao recebimento, publicidade e posicionamento futuro a ser adotado frente a seu conteúdo, ao Presidente da Câmara de Vereadores de Iracema, ao Presidente do Sindicato Municipal de Servidores, ao Magistrado Titular da Vara Única da Comarca de Iracema, a fim de que seja afixada esta Recomendação no átrio do Fórum, bem como às emissoras de rádio/blogs existentes neste Município para fins de divulgação ao público em geral.
                           Iracema/CE, 12 de junho de 2017.
_______________________________
ALAN MOITINHO FERRAZ
                                Promotor de Justiça
                      CURADOR DO PATRIMÔNIO PÚBLICO


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