segunda-feira, junho 20, 2016
Comércio de armas avança no Facebook sem controle
Grupos, páginas e perfis no Facebook anunciam e vendem
armas de fogo, munições e acessórios controlados pelo Exército e pela Polícia
Federal em um mercado paralelo sem fiscalização. Na lista de ofertas feitas na
rede social há revólver, fuzil, cano, silenciador, máquina de recarga e até um
kit importado que transforma uma pistola em submetralhadora de uso restrito das
forças militares. Tanto o comércio sem autorização legal quanto a publicidade
de armamento são crimes com pena de até oito anos de prisão e multa.
A reportagem do Estadão constatou a prática em ao menos dez
grupos fechados ou secretos no Facebook, nos quais o acesso de um membro é
controlado pelo administrador da página e as informações são bloqueadas ao
público externo. A maioria foi criada nos últimos dois anos e os integrantes se
identificam como caçadores, atiradores e colecionadores de armas, os chamados
CACs, que têm certificado de registro (CR) do Exército para comprar e portar
arma e munição para a prática de tiro esportivo.
Os anúncios dos produtos são feitos pelos próprios membros,
por vendedores ilegais ou por despachantes de armas que vendem aos
frequentadores serviços para conseguir tirar a posse ou o porte de arma na PF
ou no Exército “sem burocracia”. Fotos dos equipamentos com os respectivos
preços e especificações do produto são postadas na timeline do grupo com o
pedido para que os interessados na compra façam contato “inbox” (conversa
reservada), por e-mail ou WhatsApp, cujos dados são divulgados na página.
A partir daí não é possível saber se a negociação foi feita
dentro ou fora da lei. O artigo 17 da Lei 10.826/2003 (Estatuto do
Desarmamento) define como crime, entre outras coisas, “vender” ou “expor à
venda” arma de fogo, acessório ou munição sem autorização ou em desacordo com
determinação legal. Pela lei o comércio só pode ser feito por fábricas e lojas
cadastradas, ou entre pessoas que tenham posse ou porte de arma em dia e
somente após o deferimento da transferência do registro pela PF ou pela
Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército, dois órgãos que
controlam o registro de armas no País.
O diretor executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques,
afirma que, caso o repasse da arma seja feito sem aval, as pessoas envolvidas
poderão incorrer no crime de posse e porte ilegal, com punição prevista de até
seis anos, dependendo do tipo de arma. “A falta de institucionalidade de uma
venda pela internet, por não ter uma unidade física para fiscalização, pode
facilitar a venda ilegal de arma, que é um produto com alto potencial destrutivo.”
A Polícia Federal, a Polícia Civil de São Paulo e o
Exército brasileiro se eximiram de responsabilidade pela investigação do
comércio de armas de fogo pelo Facebook. O Exército apontou genericamente para
“órgãos de segurança pública”, a PF disse que o assunto deveria ser tratado com
a Civil, que respondeu que o monitoramento cabe aos agentes federais. Para
especialistas, a situação demonstra a falta de integração para combater crimes
nessa área.
Apreensões
Policiais do País apreenderam 118.379 armas de fogo em
circulação ilegalmente em 2014. O dado é o mais recente de abrangência nacional
e foi divulgado no 9º Anuário elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança
Pública. O relatório apontou ainda que a maioria (91%) dos equipamentos foi
retirada de circulação por ação das polícias estaduais (Militar e Civil). Em
dois Estados (Piauí e Rio Grande do Norte), a participação da Polícia Federal
nas apreensões é tão ou mais significativa do que a dos demais agentes.
O relatório pede análise sobre a origem das armas. “É
desejável que a melhor compreensão do perfil das armas apreendidas, por meio do
rastreamento sistemático, fosse usada para o desenho das estratégias mais
eficazes para retirada de armas ilegais de circulação.”
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